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Conhecimento que atravessa distâncias: "Coleções Biológicas" chegam às escolas de Ponte Alta do Tocantins
Em Ponte Alta do Tocantins, o Dia Mundial do Meio Ambiente foi celebrado com risos, olhos curiosos e mãos pequenas tocando, com reverência, a biodiversidade do Cerrado. Cerca de 600 estudantes de escolas públicas participaram de uma programação científica e educativa promovida pela Universidade Federal do Tocantins (UFT), por meio do curso de Ciências Biológicas e dos Programas de Pós-Graduação em Biodiversidade, Ecologia e Conservação (PPGBEC) e em Biodiversidade e Biotecnologia da Rede Bionorte (PPG-Bionorte).
A atividade integra o projeto itinerante “Insetos do Cerrado Tocantinense: conhecer para preservar”, aprovado no edital da 21ª Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT). Financiada pelo CNPq e pela Capes, a iniciativa levou ao município exposições científicas, oficinas interativas e jogos educativos, com foco na valorização da biodiversidade do bioma Cerrado e na popularização do conhecimento científico produzido no Tocantins.
A ação deste ano, intitulada "Coleções biológicas: conhecer para preservar", foi realizada no Colégio Estadual Odolfo Soares e mobilizou alunos de instituições de ensino municipal, estadual e da rede de educação especial (APAE), abrangendo da educação infantil ao ensino médio, além da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Para o professor Tiago Kütter Krolow, docente da disciplina de Extensão em Coleções Biológicas no Câmpus de Porto Nacional e idealizador do projeto, a ação em Ponte Alta foi resultado de um processo pedagógico construído ao longo do semestre. “Discutimos em sala, planejamos as atividades, as oficinas, as gincanas, e optamos por atender o município de Ponte Alta, considerando seu potencial educativo e o alcance social que a ação poderia ter”, explica.
Krolow destaca ainda a importância de tornar visível, fora dos muros da universidade, o que é produzido academicamente:
“Os alunos vivenciaram todo o processo de construção do evento, e ao final, puderam levar à comunidade aquilo que fazemos no câmpus, não apenas as coleções biológicas, mas também a divulgação do curso de Ciências Biológicas e do Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade, Ecologia e Conservação. Foi uma atividade exitosa, com impacto real e significativo."
A ciência em circulação
O ginásio da escola foi organizado para receber exposições didáticas de coleções biológicas dos acervos de: Entomologia, Herbário, Herpetologia, Ictiologia, Microbiologia e Paleontologia.,
A visitação era feita em grupos, com controle de público para facilitar a mediação pedagógica e garantir a participação efetiva dos estudantes.
Entre os destaques, a exposição de peças biológicas, jogos educativos como quiz, jogo da memória, “cara a cara de insetos” e oficinas temáticas de pintura, origami, gesso e modelagem aproximaram os alunos de conceitos de ecologia, taxonomia, morfologia animal e preservação ambiental.
Thiago da Silva Ribeiro, estagiário de licenciatura em Ciências Biológicas pela UFT, explica a proposta da oficina que conduziu: “Trouxemos moldes de fósseis de animais já extintos para que os estudantes tivessem contato com essas formas de vida e compreendessem que preservar também é lembrar do que já não existe.”
As atividades envolveram diretamente acadêmicos da graduação e da pós-graduação da UFT, em uma estratégia de extensão universitária que articula ensino, pesquisa e comunidade.
Acesso, pertencimento e continuidade
Para os moradores de Ponte Alta, a chegada do projeto representa mais do que uma atividade escolar. Nibelle Lira, egressa da UFT e atual diretora de escola, destaca o papel da iniciativa:
“É raro vermos esse tipo de ação em cidades do interior, principalmente em escolas públicas. Hoje, conseguimos reunir estudantes de todos os níveis de ensino. Isso é acesso. Isso é política pública de ciência".
A percepção de pertencimento ao universo científico também foi tema recorrente entre os depoimentos. Céline Mascarenhas, acadêmica do 9º período de Biologia, cresceu na cidade e retornou como parte da equipe de monitores:
“Quando estudei aqui, não havia essas oportunidades. Hoje, trazer as coleções para cá é uma forma de devolver o que a universidade nos deu".
A coordenadora do colégio que sediou a ação, Tayllane Aires, avalia que a experiência foi importante não apenas para os alunos, mas para a comunidade escolar como um todo: “O que vimos aqui foi o interesse genuíno das crianças. O olhar atento, a pergunta espontânea. É um estímulo ao aprendizado e uma sinalização de caminhos possíveis".
Um primeiro contato com o universo acadêmico
Entre os estudantes, a curiosidade foi visível. Muitos, ao final das atividades, manifestaram interesse pela universidade. Ana Flávia, estudante do 3º ano, relata: “Vi animais e plantas que nunca tinha visto. Descobri que até o mofo tem utilidade e pode ser benéfico. Quero estudar Biologia na UFT".
Fernanda, da mesma turma, complementa: “Gostei principalmente das espécies de peixes e dos insetos. Aprendi muito. Queria que essa atividade acontecesse mais vezes aqui".
Educação ambiental como política de presença
A proposta do projeto “Insetos do Cerrado Tocantinense” reforça uma concepção de ciência que dialoga com o território. Ao circular com suas coleções e suas perguntas, a universidade aproxima-se das comunidades e rompe, ainda que simbolicamente, com a lógica centralizadora do conhecimento.
Professoras como Juliana, da Escola Municipal Cleiton Maia, relatam que seus alunos reagiram à visita como se fosse uma excursão fora do estado: “Eles ficaram eufóricos, empolgados, impressionados. Vão lembrar disso por muito tempo".
O diretor da Escola Sabino Medeiros, Ebson Souza, destacou o ineditismo da experiência para os alunos: “Muitos nunca tinham visto de perto espécies vivas ou conservadas. Foi novo para mim também".
A presença da universidade pública em territórios fora do seu câmpus físico revela uma função que vai além da produção de conhecimento: é também um gesto político, um deslocamento estratégico em direção à equidade de acesso à ciência e à valorização da biodiversidade local.
Um gesto de extensão que se transforma em raiz
Na simplicidade de um molde de fóssil pintado com guache, havia mais do que pigmento. Havia memória, pertencimento e um vislumbre de futuro. Porque, ao tocar em um inseto emoldurado, ao brincar de quiz ou ao ouvir o coaxar de um anuro no “Vivo ou Morto”, essas crianças não apenas aprenderam ciência. Elas descobriram que a ciência também pode ser delas.
O professor Thiago Nilton Alves Pereira, do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Tocantins e organizador da ação, afirma a força e potencial desse projeto: “Eventos como esse fortalecem e estreitam os laços junto à comunidade e demonstram a importância de levar o conhecimento científico com ludicidade às nossas futuras gerações". Para ele, a presença da universidade em espaços escolares reforça o papel social da ciência e amplia o alcance da educação ambiental no estado.
"Porque conhecimento, uma vez partilhado, não volta ao ponto de origem. Ele se espalha, e aos poucos, transforma a forma como olhamos para o mundo. E também para onde estamos", destacou Thiago