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Amazônia precisa falar por si: o papel da “Coleção Amazonicidades” na COP 30
A COP 30, realizada em Belém, representa um marco histórico ao trazer o debate climático para o coração da Amazônia. No entanto, para que esse evento seja verdadeiramente transformador, é preciso ir além dos discursos e garantir que as vozes amazônicas estejam no centro das decisões. Nesse contexto, o lançamento da “Coleção Amazonicidades” pela Editora do Senado Federal é mais do que uma publicação acadêmica, é um gesto político e simbólico de afirmação territorial.
Organizada por Ana Claudia Duarte Cardoso e José Carlos Matos Pereira (Coordenadores do Amazonicidades), a coletânea reúne três volumes de estudos interdisciplinares sobre as cidades, vilas e territórios da Amazônia brasileira. O diferencial da obra está em sua autoria: são pesquisadoras e pesquisadores que vivem e atuam na própria região, o que garante uma abordagem enraizada, sensível e comprometida com as realidades locais. Em tempos de soluções genéricas e importadas, ouvir quem conhece o território é um ato de resistência.
O Observatório Amazonicidades, responsável pela obra, é um coletivo interinstitucional criado em 2023, composto por 80 pesquisadores(as) distribuídos pelos nove estados da Amazônia Legal. Com atuação em áreas como Arquitetura e Urbanismo, Geografia, Antropologia, Sociologia, Serviço Social, Direito, Planejamento Urbano, Economia e Engenharia, o grupo propõe políticas públicas que partem do território e dos sujeitos que o habitam. Entre suas propostas estão a criação de um Estatuto das Cidades da Amazônia, financiamento específico para infraestrutura urbana adaptada à realidade local e conselhos urbanos com participação paritária entre Estado e sociedade civil.
A coletânea foi lançada em três momentos distintos durante a COP 30, nos dias 15, 16 e 17 de novembro, em espaços simbólicos como o estande da Assembleia Legislativa do Pará (Zona Verde), a Casa BNDES e a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFPA. Cada volume aborda dimensões cruciais da urbanização amazônica: o primeiro trata das paisagens urbanas e seus conflitos; o segundo discute vulnerabilidades, políticas públicas e riscos ambientais; o terceiro mergulha nas identidades indígenas, quilombolas, afrodescendentes e de gênero, revelando como esses grupos constroem territorialidades e reivindicam o direito à cidade.
Mais do que um registro acadêmico, a “Coleção Amazonicidades” é uma ferramenta de luta. Ela denuncia os impactos das mudanças climáticas e dos grandes projetos econômicos sobre os territórios amazônicos, e propõe caminhos de adaptação e regeneração baseados em saberes locais. Ao fazer isso, desafia o modelo neoliberal de urbanização e reivindica uma Amazônia urbana plural e mais justa.
A COP 30 tem sido criticada por sua estrutura excludente, que limita a participação da sociedade civil. A divisão em zonas azul e verde, embora tradicional, reforça barreiras simbólicas e práticas. Para que a conferência cumpra seu papel, é urgente garantir que os povos amazônicos não sejam apenas cenário, mas protagonistas. A “Coleção Amazonicidades” mostra que há conhecimento, propostas e vontade política na região, basta escutar. Em um momento em que o mundo olha para a Amazônia, é essencial que ela fale por si. E essa coletânea é uma poderosa forma de fazê-lo.
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